"Uma declaração de voto, o mais sério dos textos que escrevi
Este é o texto que eu não esperei escrever desde que aqui cheguei, faz Sexta um ano. O voto, por definição, é secreto, e a decisão de o tornar público pode, ainda que legítima ser mal compreendida. Ademais, este blogue continuará, como até aqui, a ser um espaço que recebe gente de muitos cantos, e a tenta tratar pelo melhor, apesar da condição, mantida, de independente de esquerda do autor.
As declarações de voto podem gerar dinâmicas argumentativas interessantes. Mas é preciso uma convicção grande, uma certeza forte de onde pensamos estar daqui dois meses, para a fazer. E nesse sentido, sem cartões, sem fichas partidárias, e sobretudo, no meu caso, sem inimizades ou antipatias por ninguém à minha esquerda, eu entendo que a urgência da crise económica e social, e o risco para a III República das derivas presidencialistas e das fragilidades democráticas da oposição de direita me impõe assumir um voto no Partido Socialista a 27 de Setembro.
Compreendo as indignações de esquerda e partilho das críticas às derivas neoliberais que por vezes o actual executivo tenha tido. Mas sei, que, se em Portugal a alternativa é a aliança entre a visão contabilística da Política protagonizada por este PSD de Manuela Ferreira Leite, e os populismos de Santana Lopes e Paulo Portas, o país estaria condenada a uma letargia profunda e duradoura.
O PS não tem milagres para a crise económica. Mas eu atravessso o que valha a minha experiência e curriculum para dizer que mais Estado é hoje preciso para combater a crise. Com uma política social inovadora e pró-activa. Com uma política económica correcta que, olhe à necessidade de criar emprego e não aos défices. Em coerência com ter subscrio o manifesto de cidadãos pelo emprego, não posso hoje optar por uma direita atávica que julga erradamente que esta crise, a pior em 80 anos, e a pior que algum de nós experimentará, pode acabar por si. Sem investimento público, e sem tributação diferenciada que discrimine positivamente os que mais necessitam.
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Não me sinto capaz também, aos 33 anos, de abdicar de sonhar. De imaginar que o país acabou. De me render a que nunca teremos alta velocidade, banda larga na dimensão dos outros países líderes, que nunca compreenderemos que o ambiente e as energias limpas são sectores de futuro. Hoje lideramos mundialmente em muitas destas áreas. Somos um país de referência nas energias renováveis. Somos um dos países do mundo onde a web de banda larga é mais usada per capita. Somos, finalmente, dados à tecnologia. Porque não houve medo de fazer apostas, criar estruturas, correr o risco do gozo das oposições com os Magalhães ou com a habilitação em tecnologias de informação de pessoas sem formação liceal completa, via Novas Oportunidades. Não houve medo de trazer para Portugal, em lugar de 10 estádios faraónicos, um centro de investigação aplicada, na tecnologia da microescala, em Braga, numa saudável pareceria com a Espanha. A tal que o Dr. Paulo Rangel queria que tomássemos como inimigo.
Votar no PSD da Dra. Ferreira Leite significava aceitar que quando o consumo das famílias está em queda livre, a solução passava por ouvir o Prof. César das Neves e o Dr. Vitor Bento e baixar os salários. Passava por aceitar que a solução no Público, são acordos em que cento e tal pessoas, equivalendo e 100 e tal famílias, aceitam a chantagem de ganhar menos para não perder o emprego. Passa por pensar que estaria a eleger pessoas que acham que uma crise de procura (o que é o mesmo que dizer, de excesso de poupança) se resolve obrigando os agentes, a poupar mais. Quando as oportunidades de investimento privado escasseiam, e este cai a pique, a Dra. Manuela e a sua equipa propõe-se poupar o dinheiro público. O que só poderia ter uma consequência: afundar ainda mais Portugal.
Aos 33 anos eu não posso aceitar o risco de ver essa solução no país que com escolhi para viver. Não posso ceder ao facilitismo de direita e dizer que a política de saúde foi má. Pelo contrário. Como já aqui debati, e a esse tema voltarei, o estilo comunicacional pode ter sido péssimo, mas Correia de Campos foi o homem que criou a Rede Nacional dos Cuidados Continuados Integrados. E em nenhum governo, como neste cresceu a quota de mercado de genéricos, e a política social do medicamento para os idosos. Quando leio as ideias do PSD na Saúde só encontro as expressões: privado, despesa, corte, despesa, privado, poupar. Há muito a fazer nos genéricos. Escrevi sobre isso. Está documentado em estudos públicos. Assusta-me uma direita que tem da saúde uma visão mercantilista e comercial.
Que quer importar um modelo inglês, que por experiência sei, é dos maiores fracassos daquele país, e que nem sequer faz as contas e vê que meta que estabelece para as listas de espera de cirúrgias não oncológicas ultrapassa o tempo médio de espera já existente. Isto é um nível de desleixo na elaboração de políticas, que a meu ver, não se qualifica como alternativa.
Não vou percorrer os sectores. Vou concluir com duas notas importantes. Não tenho, e por favor deixem-me gritar, NÃO TENHO MEDO do que comummente se chama extrema esquerda. O meu voto no PS é um voto positivo, de confiança, de identificação. É um voto esperançadao num PS menos neoliberal e mais social. E esperançado no renovar de uma maioria.
Mas não é de todo um voto de medo da necessidade de coligações à esquerda. Venham elas se necessárias forem. Porque este BE não me assusta: o Rui Tavares, o João Rodrigues, o João Teixeira Lopes, entre tantos outros, são gente com que tive o prazer de lidar. E que sei que são democratas convictos, com preocupações sociais profundas, e um entendimento da crise, que vai para além do que qualquer Miguel Frasquilho de serviço possa atingir.
Quase que me apetece pedir-lhes desculpa por não lhes ir confiar o voto. Mas, espero honestamente que entendam que temo por essa dispersão favorecer, com o Presidente que temos, e com o populismo demagógico à direita, o pior dos cenários para quem quer que se diga de Esquerda.
Há depois matrizes que não coincidem e que me aproximam mais do PS. Mas isso eles já sabiam. E também nisso se vê a grandeza da Esquerda: nunca nos impediu de colaborar. E espero que não seja esta declaração de voto que o venha a impedir.
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A palavra final vai para o Homem. O líder do partido em quem expresso a minha confiança. Que é, em bom rigor, uma confiança que deposito nele. Não há matriz de identificação que sobreviva a desconfianças pessoais extremas. Sócrates não é de todo, para mim, o mal menor. Se à direita a alternativa é má, o ímpeto reformista na economioa, na saúde, na tecnologia, no plano social, e em todos os sectores que acima não listei, foram uma marca registada que ele trouxe de volta à governação à Portugal. Derivas todos temos, mas José Sócrates merece a minha confiança como homem de rigor reformista, que sabe o que correu bem e o caminho a trilhar para que as coisas corram ainda melhor. E sobretudo, é aquilo que custa a muitos reconhecer: o homem que apanhaou o barco no meio da pior crise em 80 anos. Não fugiu para nenhum cargo internacional, não largou o navio depois de umas europeias que correram pior, contrariamente a Barroso há 4 anos. Sócrates sujeita o pescoço à demagogia de direita indo a votos no mais desfavorável dos contextos, sabendo que nunca será fácil explicar a um desempregado que a empresa dele regressou ao país de origem como o IDE está a fazer por todo o mundo.
Pelo que fez, pelo que quer fazer de diferente, pelo quer continuar, pela coragem de continuar, eu admiro José Sócrates, e deixo aqui esta declaração de voto.
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O blogue retoma de seguida o seu rumo normal, sem excessos de protagonismo pessoal do seu autor. As minhas desculpas por este toque pessoal aos meus leitores e amigos. Quis ser claro. Espero que compreendam. A linha do blogue será a de sempre.
Um abraço, e cá estaremos.
Por Carlos Santos in http://ovalordasideias.blogspot.com/2009/07/uma-declaracao-de-voto-o-mais-serio-dos.html