Divisões
Eu sou um Liberal. Na Europa, esse termo é hoje utilizado em certos círculos como uma espécie de anátema, sendo os liberais vilipendiados pelas suas ideias "de direita", relativas especialmente a questões económicas. Ora, sucede que eu sou um Liberal, um Democrata, e já agora considero-me de esquerda. É assim insultuoso para mim, que o termo Liberal seja utilizado de forma quasi-perjorativa, quando os Liberais, de mui nobre ascendência em Portugal e no Estrangeiro, sempre estiveram na vanguarda das transformações sociais para a liberdade e dignificação do ser humano.Mas tal rótulo (o de liberal equivaler a de direita, e a um tipo de defensor de teorias exploradoras) surge de certa forma, de maneira compreensível. Vamos por partes.A divisão Esquerda/Direita, em termos políticos, surge nos Estados Gerais Franceses de 1789, com os Liberais do Terceiro Estado (O Povo) sentados à esquerda do Presidente da Assembleia, e o Segundo Estado (A Nobreza) sentado à direita. De facto, a divisão política original que ainda nos guia (Esquerda contra Direita) originou numa dicotomia de Liberais contra Conservadores. Os Liberais de Esquerda, os Conservadores de Direita. E foi esta dicotomia que durou durante 50 anos até que um senhor absolutamente genial, de nome Karl Marx introduziu uma nova variável nesta equação. Em 1848, surge o Manifesto Comunista. Até este livro, os liberais eram os defensores não só do comércio livre, mas também das liberdades individuais e da existência de um governo mínimo. No entanto, o rápido crescimento económico da Revolução Industrial sujeitou muita gente a uma exploração grosseira, impeditiva do exercício de liberdades individuais pelas quais os Liberais lutaram (inclusive em Portugal, contra os conservadores de D. Miguel). O Manifesto Comunista redescreveu a maneira como a sociedade se dividia na altura. De Liberais a Conservadores, passamos a ter Exploradores e Explorados, segundo a dialéctica Comunista. Esta exploração era feita nos tempos da Revolução Industrial, pelos comerciantes (A Burguesia) isto é, por parte dos maiores apoiantes dos Liberais.Surge assim, um cisma no movimento Liberal: O raciocínio comunista obriga à divisão dos liberais, entre aqueles que defendem o comércio e o estado reduzido, e entre aqueles que dão primazia à liberdade individual. Uma das metades liberais, funde-se aos Conservadores da época, juntando aos valores religiosos e nacionalistas, a apetência pelo comércio (que anteriormente, não era defendido pelos conservadores), enquanto que a outra se aproxima dos comunistas, sem se fundir, dado o carácter extremado do movimento Comunista. Dão sim origem aos movimentos de centro esquerda e de centro direita que podemos observar durante todo o século XX. Este centro vai obviamente flutuando, e com a emergência de uma potência Comunista, fica definitivamente mais à esquerda, pelo menos na Europa. É curioso como homens como Hayek vociferam contra o facto de até os conservadores começarem a estar parecidos com os comunistas após a segunda guerra mundial (especialmente por haverem conservadores a defender nacionalizações, entre outras coisas).No entanto, o projecto Comunista vai à falência em 1990. Com ele vai uma ideologia com quase 150 anos, e milhões de vitimas dos Gulag e da Grande Marcha, entre outras. Este evento, mais que puxar o centro político para a direita (pela falta de um contrapeso de esquerda), destruiu o motivo da divisão dos liberais. Assim, observamos actualmente aquilo que é tido como uma "aproximação à direita" de vários partidos de esquerda, pelas suas posições relativas ao papel do Estado na economia, e relativas ao comércio internacional. Isto é parcialmente verdade. O que estamos a assistir, é a um regresso às origens dos liberais. Com este regresso às origens, vemos também os Conservadores a mostrarem a sua velha face: O seu nacionalismo, o seu proteccionismo.Obviamente, os Liberais de hoje aprenderam coisas relativamente aos Liberais de ontem. Actualmente dispomos de conhecimento e lucidez para aceitar que um governo pode ter um papel predominante na redistribuição de riqueza e oportunidades, papel esse que é potenciador de liberdade individual. Este crescimento do governo é aceitável apenas nesses domínios. Nos domínios do indivíduo, das suas liberdades e privacidade, os Liberais estão minimalistas como sempre: O governo não tem nada a ver com o que fazemos nos nossos quartos, ou com quem, e cada um sabe de si mesmo.Curiosamente, estas posições são atacadas por um novo tipo de conservador: O comunista. Este defende uma ordem que já demonstrou o quanto vale (ou não vale), defendendo cegamente um Estado gordo, interventivo, paternalista. Em moldes diferentes dos conservadores de Deus pátria e família, mas conservadores à sua maneira. E são estes que vilipendiam a palavra Liberal. Mas deixai-os.Citando um grande Liberal, "A witty saying proves nothing" (Voltaire).Continuaremos assim na nossa longa tradição de defesa do povo. Como é a nossa tradição. Espero que não seja cometido nenhum erro.
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